Edicões Gambiarra Profana/Folha Cultural Pataxó

quarta-feira, 30 de maio de 2012

MAR ABERTO


Se procuro Você
Não sei como procurar
Não sei onde encontrar
Procuro Seus olhos
E não ouço nada
Não vejo o brilho da Sua Palavra
E me perco na estrada
Se o sol ilumina meu caminho
Tenho medo de seguir sozinho
Se Você visita minha casa
Não sei como abrir a porta
Se Você está
De braços abertos
Nunca estou perto
Se o mar se abriu pra mim
Esqueci de atravessar
Meu paraíso ficou distante
E não consigo sorrir como antes

Arnoldo Pimentel

sexta-feira, 25 de maio de 2012

ORAÇÕES E PRAÇAS "VAZIAS"


 Meninos de rua ganham bola
Ganham promessas
Ganham sopa
Ganham cola
Orações e
Esmola
Não ganham livros
Nem família
Nem convite pra igreja
Nem futuro
Nem escola

Arnoldo Pimentel

Visite a Folha Cultural Pataxó e leia o excelente texto do amigo e escritor Jorge Pimenta, link abaixo:




sábado, 19 de maio de 2012

SÃO LOURENÇO



Seria apenas um último olhar
Talvez com um pouco de tristeza
De incerteza
Mas um último e profundo olhar
E tudo então ficaria ali

Depois seria só olhar pra frente e caminhar
Acreditar que depois do deserto há um Oasis a esperar
Na bagagem apenas um jeans desbotado
Um sonho para ser alcançado
Um projeto de vida inacabado

Mas as lembranças ainda estarão nos olhos
No rosto marcado pelo sabor amargo
De nunca ter tido ninguém ao seu lado

As noites serão ao relento
Sonhará com a voz meiga e doce
Que toca seus ouvidos e seu coração
Nas noites de São Lourenço
E vinha pelo vento do pensamento
Eternizava cada momento

Era a estrela no deserto a lhe tocar
Pedindo todo amor que tinha para dar
Era o Oasis que precisava encontrar

Seria apenas um último olhar
Um deserto para atravessar
Um Oasis a lhe esperar
Um sonho para acreditar
Sem ter medo de outra vez
No meio do vento
Naufragar



A noite de São Lourenço é quando se vê o maior número de estrelas na Itália, conhecida como a noite mais romântica de todas e muitas pessoas vão a Toscana para ver a chuva de estrelas cadentes e fazer um pedido, realizar o sonho de felicidade.

domingo, 13 de maio de 2012

GUARDANAPO


GUARDANAPO
Este poema foi escrito em 1982 e foi meu primeiro poema censurado em público, no meu lugar de trabalho, rasgado e atirado no lixo, acompanhado das palavras “Que merda é essa que você está escrevendo, cuidado como que escreve.” mas eu tinha uma cópia e eu e esse meu chefe ficamos amigos.
Somos todos descartáveis
Como guardanapos atirados ao chão
Ou o relógio de ponto
Que só presta quando está bom

Somos figuras carimbadas
Na hora do serão
Sem dinheiro pra comida, nem pra escola
Na porta esticando a mão
Pedindo esmola para o patrão

Patrulha que nos patrulham
Nos corredores escuros da fábrica
Da hora da entrada
Até a hora da saída sem vida

Somos todos descartáveis
Como guardanapos atirados ao chão
Ou milhadas de pão
Nessa vida de cão

 
Hoje dias das mães meus blogs terão publicados apenas poemas que escrevi no tempo em que ela estava entre nós, poemas antigos que fazem parte da minha história, minha mãe Helena que nos deixou em 1995 sempre leu meus trabalhos, desde que escrevia poemas tolos com 16 anos por ai.Saudades dela.Links abaixo, basta passar o mouse.
 

domingo, 6 de maio de 2012

TREM DA ILUSÃO


                                                                
             Hoje é só um dia que o trem não irá enfeitar sua vida.  O dia amanheceu sem alegria,  a chuva embaça a janela por onde seus olhos procuram o céu para saber se está claro para poder sonhar com seu trem no quintal. Hoje a chuva embaça seus sonhos de liberdade no apito que invade o espaço cortando o ar com a delicadeza de sua voz. Seus olhos já estão embaçados como a janela pelas lágrimas que escorrem pelo rosto, pelo desgosto.
             Nesses dias de chuva o pequeno quintal de sua casa passa ser como um horizonte longe demais, então sua sala seria o lugar para seu  trem. Se tivesse um trem de brinquedo, pegaria a máquina e tiraria a poeira com um pequenino espanador, pegaria uma flanela e daria um brilho para ficar bonita como uma princesa de aço, limparia o vagão de lenha e depois os vagões de carga, que seriam dois e por fim os três de passageiros, sim, seria um trem grande, bonito, vistoso. Armaria a estrada de ferro pela sala, emendando pedaço com pedaço, sem pressa, passando a estrada por trás da estante, do sofá, das poltronas e pelo meio da sala, ali seria como o deserto, uma pradaria sem fim, cercada de nada por todos os lados, pelos fantasmas da sede e da solidão, pela noite fria e pelo dia escaldante, com o sol brilhando com toda sua beleza e sua força, assim os passageiros iriam sentir toda a solidão que existe no deserto, no deserto dos lobos, das pessoas, dos poetas, até a caixa d’água, sim, ele não esqueceria a caixa d’água no meio do deserto, ela iria matar a sede do trem e das pessoas, sua sede de brincar, sua sede de amar cada pedaço do trem, sua sede de viver cada minuto da sua infância, depois de matar a sede todos iriam seguir viagem pelo meio da sala, meio do nada, do quadro pintado ao seu redor,  medo de ficar só.Depois de algum tempo de viagem, iriam avistar o povoado, o trem apitando, as pessoas se aglomerando na estação, estação onde chegavam sonhos, de onde partiam sonhos, estação de todos, estação de ninguém, estação de trem, mas não havia trem, apenas uma sala vazia, vazia como sua infância, por onde perambula, por onde só pode ficar com seus pensamentos de um dia ir adiante. Seu olhar só quer fitar os pingos da chuva, tentar enxergar quando passar, para saber se ainda poderá viver, poderá brincar, brincar com seu trem feito de madeira, pedaços de madeira, feito de imaginação, feito de coração, então quando a chuva passar, correrá para o quintal, nem mesmo esperará a terra secar, e montará seu trem com os pedaços de madeira, com os pedaços de sua história, que um dia há de se montar e se mostrar.
             O menino ficou ali observando a chuva pela janela embaçada, as nuvens negras que escondiam o sol, que cobriam o céu, os raios que cortavam sua esperança, como a realidade adulta corta os sonhos de criança. A noite caiu, não tinham estrelas, olhou mais uma vez pela janela, sentiu o frio do desencanto e resolveu entregar-se ao sono, deitou-se desejando sonhar com um dia de sol, que enfeitaria seu quintal para poder sentir alegria no seu coração e montar seu trem de madeira, seu trem feito de ilusão.

Arnoldo Pimentel


Esse conto faz parte da Trilogia dos Meninos